Saber analisar uma empresa é uma das tarefas mais importantes para quem pretender investir na bolsa. O objetivo deste artigo é ajudar-te a dar o conhecimento básico para dares o primeiro passo na seleção de boas empresas para investir. Assim, vais saber como escolher ações para o longo prazo e para a tua carteira de investimentos.

Com tantas empresas listadas na bolsa de valores, dos mais diversos tipos e setores, escolher uma ação para investir não é uma tarefa fácil… muito menos para quem não sabe fazer uma análise fundamentalista.

Análise fundamentalista

A análise fundamentalista consiste em analisar a saúde financeira da empresa, o cenário económico em que está inserida, o seu histórico de resultados, bem como a sua projeção futura. Este tipo de análise deve ser comparada com outras empresas do mesmo setor, de forma a entender o contexto em que a empresa está face ao mercado.

Um dos principais precursores desta técnica é Warren Buffett. Utilizando os princípios desta análise, ele procura indicadores que permitam encontrar empresas subvalorizadas (a um preço abaixo do que deveria ter), e com um potencial de crescimento e valorização futuro.

Imagina que queres comprar uma casa nova, moderna, e com acabamentos espetaculares, avaliada em 200.000€, e que o preço médio das casas nesse bairro é o mesmo. No entanto pedem-te 300.000€ pela casa… Apesar da casa ser um bom investimento, o preço que te pedem por ela é superior áquilo que ela vale, deixando de ser um negócio justo. Nas ações é igual!

Quando queres investir, deves sempre colocar-te no papel de quem vai comprar a empresa toda. De certeza de que não irias comprar uma empresa a um preço acima daquilo que ela realmente vale. Colocando-te nesta posição, além de quereres comprar uma ação num preço abaixo, ou dentro daquilo que ela vale, também vais querer estudar e analisar a empresa de forma a que isso aconteça. Isso é meio caminho andado para fazeres bons investimentos!

Comprando uma ação de uma empresa com potencial, bem gerida e a um preço abaixo do justo, no longo prazo esse preço com certeza vai subir, originando uma valorização do ativo que compraste.

Indicadores fundamentais

Para conseguires fazer uma correta análise fundamentalista de uma empresa, deves ter em conta alguns indicadores, que nunca devem ser utilizados de forma isolada na escolha de uma empresa para investir, mas sim em conjunto:

ROE

O ROE, Return On Equity, ou em português, Retorno sobre o Património Líquido é um indicador que tem como objetivo medir a capacidade que uma empresa tem para gerar lucro a partir dos próprios recursos e do dinheiro investido pelos acionistas.

Através deste indicador, é possível comparar a rentabilidade da empresa, e a possibilidade dela apresentar bons resultados, e assim valorizar o investimento de quem aplicou dinheiro nas suas ações. Se a empresa tem apresentado ROE’s consistentes e altos ao longo dos anos, tendo inclusive conseguido aumentá-lo, então pode ser um bom investimento.

O ROE é então um indicador de eficiência de gestão, pois mostra se a empresa está a aplicar bem o dinheiro dos acionistas para os seus devidos fins.

Este indicador deve ser medido em comparação com outras empresas do mesmo sector. Assim dá uma ideia de qual é a empresa que melhor utiliza os seus recursos para gerar valor.

1) Como calcular

O ROE é um percentual calculado com base na divisão entre o lucro líquido e o património líquido de uma empresa num determinado período de tempo.

ROE = (Lucro Líquido / Património Líquido) * 100

Exemplificando, no caso da Johnson&Johnson, em dezembro de 2019, teve um lucro líquido de 15 119M$, e um património líquido de 59 471M$ (valores em milhões de dólares).

Aplicando na fórmula, o ROE da empresa é:

ROE: (15 119M$/59 471M$) * 100 = 25,42%

2) Exemplo

A Johnson&Johnson e a Pfizer são duas concorrentes no mercado da saúde.

Vejamos então os seus ROE:

  • Johnson&Johnson
ROE JJ - Analisar uma empresa
  • Pfizer
ROE PFIZER - Analisar uma empresa

Comparando as duas empresas, vemos que o ROE da Johnson&Johnson tem sido o mais consistente e o que mais tem aumentado ao longo dos anos (exceção feita a 2017, ano em que comprou a empresa Actelion), sendo por isso a melhor opção tendo em conta apenas este indicador.

3) Valores aceitáveis

Em tese, quanto maior o ROE, mais rentável é uma empresa, e melhor para o investidor.

Bons indicadores costumam ultrapassar os 15%.

Dividend Yield

Um dos indicadores para analisar uma empresa que pague dividendos, é o Dividend yield, em português Rendimento de Dividendos. Este indicador mostra a relação entre os dividendos distribuídos e o preço atual da ação.

1) Como calcular

O cálculo do Dividend Yield traduz-se em:

Dividend Yield = (Dividendos pagos por ação/Valor da ação) * 100.

2) Exemplo

No caso da Coca-Cola, imaginando que tem um preço por ação de 50$, e um dividendo de 2$ por ação:

Dividend Yield: 2$/50$ * 100 = 4. Ou seja, a Coca-Cola tem um Dividend Yield = 4%.

Este percentual mostra que cada ação retornou 4%, em dividendos da Coca-Cola, no período de um ano.

É interessante compararmos este indicador à taxa de um depósito a prazo de um banco, por exemplo… nos dias de hoje é comum encontrarmos depósitos com taxas por volta dos 0.1%. Enquanto na Coca-Cola, com um Dividend Yield de 4%, investindo 500$, no final de um ano terias recebido 20$ em dividendos. A grande diferença entre o investimento nas ações, e num depósito a prazo é o risco inerente ao investimento na bolsa, pois sendo variável e volátil, os 500$ que investiste poderiam ter rendido para um valor superior ou inferior.

3) Valores aceitáveis

Não existe um padrão relativamente a um valor aceitável de Dividend Yield, pois depende sobretudo da política de distribuição da empresa.

Geralmente as empresas em crescimento ou de inovação têm um Yield de 0%, ou muito baixo, pois não têm como principal objetivo para o seu dinheiro a distribuição de dividendos, mas sim o reinvestimento do lucro na expansão da empresa.

No caso das líderes de mercado e empresas consolidadas, por não terem muito mais espaço de crescimento no seu setor, normalmente a melhor opção para o seu dinheiro é a distribuição de dividendos aos seus acionistas. Essas empresas, tais como a Coca-Cola, Colgate-Palmolive, 3M, Cisco, Intel, etc, têm um Dividend Yield entre 2% a 5%.

Um valor mais alto do que esse pode ser um indicador perigoso, e pode significar que a empresa tenciona oferecer uma taxa alta para atrair capital de investidores.

Payout Ratio

Outro indicador importante nas empresas pagadoras de dividendos é o Payout Ratio, ou Taxa de pagamento de dividendos. Este rácio mede a percentagem dos lucros que as empresas distribuem aos seus acionistas.

1) Como calcular

O Payout Ratio é com calculado com base na divisão entre o dinheiro pago aos acionistas sobre os lucros líquidos que a empresa teve num ano fiscal:

Payout Ratio = (Dividendos distribuídos/Lucro líquido) * 100

2) Exemplo

Supondo que a Starbucks teve um lucro líquido em 2019 de 15 000M$ e distribuiu um total de dividendos no valor de 2 000M$.

O seu Payout Ratio corresponde a: (2 000M$/15 000M$) * 100 = 13,3%

3) Valores aceitáveis

Payouts elevados significam um alto dividendo aos acionistas. Ou seja, quanto maior a percentagem, melhor, certo? Não necessariamente.

É importante ter cuidado com payouts altos e avaliar se a empresa não se está a endividar para agradar aos acionistas de forma a manter a distribuição de dividendos.

Imagina que num ano mau em vendas, a Starbucks teve uma queda nos lucros, mas pretende cumprir com a distribuição constante de dividendos aos acionistas, mantendo o mesmo dividendo do que no ano anterior. Para fazer isto, o percentual Payout Ratio vai aumentar, apesar da queda nos lucros.

Pode-se então dizer que um Payout Ratio “saudável” é até 60%. Um valor mais elevado deve ser cuidadosamente analisado e avaliado se a empresa não tinha melhor uso para o dinheiro distribuído aos acionistas.

EPS

O EPS, Earnings per Share, ou em português, Lucro por Ação, revela o lucro que uma empresa gera por cada ação emitida no mercado. É calculado através do rácio entre os resultados líquidos de um determinado período e o número de ações ordinárias da empresa.

Este indicador dá uma indicação do montante que cada investidor ganha por cada ação que possui.

1) Como calcular

O EPS é calculado da seguinte forma:

EPS = Lucro líquido/Número de ações em circulação

2) Exemplo

Vamos comparar o EPS de duas empresas do mesmo setor, que tão bem conheces, a Visa e a Mastercard:

  • Visa
EPS VISA - Analisar uma empresa
  • Mastercard
EPS MASTERCARD - Analisar uma empresa

Podemos ver que ambas as empresas têm tido uma evolução do EPS bastante consistente ao longo da última década, tendo aumentado em quase todos os anos.

Ainda assim, a Mastercard apresenta o EPS mais alto em todos os anos, e apenas não o aumentou em 2017, sendo por isso a melhor opção entre as duas empresas, tendo em conta apenas esta indicador.

3) Valores aceitáveis

Numa primeira instância podemos verificar se a empresa é lucrativa ou não. Um EPS negativo revela que a empresa deu prejuízo.

Quanto maior o EPS, melhor. Ainda assim, é necessário avaliar a maneira como a empresa chegou ao lucro, verificando se foi de uma forma consistente. Investindo por um longo período de tempo, devemos verificar o histórico de EPS da empresa. O ideal será este indicador crescer todos anos, ao longo dos últimos 10 ou 15 anos, pois isso significaria uma evolução sustentável da empresa.

P/E

Outro indicador para poderes analisar uma empresa é o P/E, Price-to-Earnings, em português, Preço sobre o Lucro, é um múltiplo calculado a partir do preço atual da ação em relação ao seu lucro por ação (EPS).

Na prática, ele é um múltiplo do preço, pois mostra o quanto os investidores estão dispostos a pagar pelo lucro obtido por ação (EPS) no período anterior.

É um dos indicadores mais populares entre os investidores para analisar uma empresa, pois pode ser usado para verificar se uma ação está valorizada a um preço justo, sobrevalorizada ou subvalorizada. Uma interpretação geral é que uma empresa com um alto P/E deverá ter maior crescimento de lucros no futuro.

O P/E é calculado através da relação entre o preço atual de uma ação sobre o lucro por ação desse ativo.

1) Como calcular

Para calcular o P/E basta dividir o preço da ação pelo EPS:

P/E = Preço da ação/EPS

2) Exemplo

Supõe que a Apple tem um P/E de 25x (25 vezes) e a Microsoft 18x (18 vezes), isso significa que investindo na Apple demorarias 25 anos a recuperar o teu investimento, enquanto que na Microsoft seriam apenas 18 anos.

3) Valores aceitáveis

Na teoria, quando temos em conta apenas o P/E de uma empresa, a interpretação é de que, quanto mais baixo ele for em relação ao P/E de outra empresa, ou com a média do setor, mais barata e a melhor preço está a ação. Um valor abaixo de 20x é o ideal.

PEG

O indicador PEG, em português, Preço sobre o Lucro e o crescimento, é um complemento ao P/E, pois este relaciona-o com o crescimento dos lucros (EPS) para avaliar se uma ação está atrativa face ao seu crescimento.

Como falámos, um P/E baixo é um bom indicador, mas é ainda mais interessante se levarmos em conta a projeção de crescimento dos lucros.

1) Como calcular

O cálculo do PEG não é complicado, basta calcular o P/E e dividi-lo pelo G, que vem de Growth (em português, crescimento):

PEG = (P/E / Crescimento do EPS) / 100

2) Exemplo

O P/E já sabes calcular. Para encontrar o crescimento do EPS (o tal G de Growth) vamos supor a seguinte situação:

  • O EPS da Mastercard em 2018 foi de 5,60$
  • O EPS da Mastercard em 2019 foi de 7,94$

Assim sendo, a taxa de crescimento do EPS é: (7,94$/5,60$) – 1 = 0,42 (42%)

Supondo que a Mastercard tem um P/E de 25x, então:

PEG = (25/0,42)/100 = 0,60

3) Valores aceitáveis

Como a nossa visão é de longo prazo, através de investimentos de VALOR, o PEG é muito útil pois ajuda a entender a evolução dos lucros da empresa, relacionando com o preço da ação.

Pode acontecer uma boa empresa ter um P/E alto, mas como tem uma elevada taxa de crescimento dos lucros, pode ser uma boa oportunidade de investimento.

Empresa P/EEPS GrowthPEG
Apple 205%4
Microsoft3035%0,85

Olhando apenas para o P/E, a melhor escolha seria a Apple, pois tem o rácio mais baixo.

No entanto, a Microsoft apesar de ter uma razão preço/lucro mais alta, tendo em conta o crescimento dos lucros da empresa, foi quem apresentou um maior aumento, e um PEG mais baixo, sendo por isso aquela que apresenta um preço mais barato face à sua evolução.

De uma forma resumida, quanto mais baixo o PEG melhor. Um valor abaixo de 1 é o ideal

Onde encontrar os indicadores para analisar uma empresa

Uma das formas de calcular estes indicadores é através da análise do balanço patrimonial e da demonstração de resultados da empresa.

No entanto, existem alguns sites onde podes encontrar estes indicadores já calculados, tais como:

Basta uma pesquisa pelo Ticker da empresa e rapidamente encontras alguns indicadores.

Este é outro dos sites onde podes encontrar informação sobre indicadores, além de notícias e análises sobre a empresa.

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Disclaimer: Este artigo não constitui recomendação de compra ou venda de nenhum ativo. O intuito é contribuir com conhecimento e educação financeira para o investidor tirar as suas próprias conclusões, tendo em conta os seus objetivos e perfil de investimento.